Suflítica

A palavra não existe no Priberam, escusam de procurar. É um substantivo pessoal feminino usado para descrever pessoas nervosinhas que sofrem por tudo e nada, principalmente no que diz respeito a crianças. E é o nome que a minha família, carinhosamente, me dá de cada vez que eu salto em socorro por um acidente que ainda nem aconteceu.
Ser suflítica não é, no entanto, uma escolha consciente, mas um reflexo irrefletido que dispara os níveis de adrenalina do corpo de forma descontrolada. É ser capaz de imaginar cenários tenebrosos nos segundos que nos separam de agarrar uma criança em perigo de queda. É visualizar todo um quadro dantesco quando a criança decide arriscar um bocado além dos nossos limites seguros. É sentir os joelhos fraquejarem, o coração disparar e os pés gelarem nos segundos que antecedem um possível perigo.
É sinónimo de ser neurótica, e é sem dúvida instigado por um ambiente de ansiedade permanente, cuja origem daria direito a dissertação para uma tese de mestrado de Psicologia. É uma guerra constante com a mente, que nos atraiçoa sempre que tentamos relaxar, e nos coloca num loop de medos e inseguranças. É uma grande barreira para a maternidade.
Ultimamente, tenho me apercebido que a Unicórnio tem inseguranças e medos, e receio que parte deles lhe sejam transmitidos pela minha própria insegurança, pois tenho a impressão que os mesmos pioram na minha presença.
Vamos ao parque, e eu sigo-a de perto antecipando as quedas (sim, é mau, eu sei), e quando a encorajo a tentar mais, mesmo estando perto, ela tem medo de arriscar passar na corda que abana, ou subir o degrau inclinado, ou algo mais “arriscado”. Pede-me a mão, agarra-se a mim, grita que não quer. Vai ao parque com os pais ou os avós, ou até na escola, trepa, sobe, escala, salta tudo e mais alguma coisa, sem medo.
Vamos a piscina, vem comigo para a piscina mais funda, e mesmo de boias não larga as mãos, agarra-se como um lapa ao pescoço e grita se a tento desprender e incentivar a nadar sozinha. Vai a piscina sozinha com o pai, e arrisca largar as mãos e nadar um pouco sozinha sem agarrar a mão de ninguém.
Vamos à praia e tudo é um problema: a areia que está suja, o vento que arrasta o guarda-sol, as algas que assustam e o mar, nem pensar lá meter um pé! Vai andando à frente com o avô, e quando chego à praia, passou a pé um areal de areia grossa, está dentro da água do mar, e para minha enorme surpresa as algas afinal são “fofinhas”!!
Inevitavelmente, começo a pensar que o problema sou mesmo eu. Que as minha inseguranças, medos e ansiedade se refletem negativamente na autoconfiança dela. Que em vez lhe transmitir segurança quando a acompanho no parque, estou a transmitir-lhe a minha insegurança e fazer com que tenha medo de arriscar. E isso preocupa-me e entristece-me.
Quero criar uma criança forte, autoconfiante, responsável mas que seja capaz de arriscar, de testar os seus limites, de tentar.

Receio estar a sabotar este plano, mesmo que inconscientemente, receio ser eu a maior falha neste plano…

RuiTorresPhotography



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